sábado, 27 de junho de 2009

Arteterapia e Clínica Transdisciplinar: mãos que criam singularidades




A Clínica Transdisciplinar é um processo terapêutico com uma estrutura vital que funciona como uma célula, com a potência de se recriar a cada instante. A psique humana, como as células, necessita de um meio ambiente que lhe forneça elementos para recompor, restaurar e recriar a si mesma. O setting terapêutico (o local onde se dá o atendimento) é uma parte importante neste processo. A estrutura e o comportamento da célula podem ser comparados com o funcionamento da psique, pois necessitam de locais simbólicos e físicos que possam funcionar como meio externo que alimente e reestruture continuamente a célula ou a psique. O meio externo funciona como um espelho para a psique, e reflete o eu do sujeito, ou produz tensão. Necessitamos de algo que “force” a consciência a um alargamento, pois não são as racionalizações e os ditos “conhecimentos e técnicas” que alargam a psique, são as experiências e os modos que cada pessoa desenvolve de se alimentar desta experiência. Enquanto uma célula se apropria de elementos externos a ela para sobreviver, o ser humano muitas vezes rejeita aquilo que considera desconhecido no seu meio ambiente. A célula tem mecanismos biológicos próprios para achar o que vai ser nutritivo a ela, o homem sendo um ser filho da cultura pode ser estimulado culturalmente a se desconectar de sua capacidade biológica e sensorial estar incluida no processo de fazer escolhas. Patrícia Berry, em Fathers and Mothers (de Erich Newmann, 1977) escreve sobre um temor que há em “encarnarmos” a nós mesmos, em tornar algo em nós substância e em dar forma ao potencial na psique.

A Arteterapia por ativar a experimentação corporal pode ser uma estratégia para que o sujeito possa se reconectar com outras partes de si, partes da sensorialidade, por exemplo, que ampliam nossa capacidade de sentir e pensar considerando diferentes aspectos de si. Instrumentos como o pincel, o lápis se tornam extensões do corpo e estes podem participar do pensar, assim como o resultado da expressão pode surpreeder nos de modos múltiplos, estes aspectos citados participam no novo modo de pensar-sentir-intuir-experimentar e fazer as próprias escolhas ou escolhas mais próprias da nossa singularidade em continua construção.

Em meu trabalho desenvolvo muitos elementos da Arteterapia juntamente com as questões de uma Clínica Transdisciplinar. O objetivo é ativar as mãos do individuo simbolicamente e metafóricamente dentro de atravessamentos múltiplos oferecidos pelo meio cultural e subjetivo em que a pessoa vive. Para que os movimentos psíquicos possam adquirir forma e ganhar corpo necessitam de um contato genuíno com as vivências que estimulam a corporalidade do individuo. As técnicas desenvolvidas na Arteterapia podem ser utilizadas como um tipo de canal que possibilita expressar elementos psíquicos, afetivos e desconhecidos a ele mesmo. A Clínica Transdisciplinar Arteterapeutica pode utilizar materiais concretos, como água, guache, caixa de areia em seus aspectos reais e metafóricos, sem racionalizações. Produzimos na nossa clínica uma matriz sustentadora de substratos básicos para o individuo. Pois estes se encontram inseridos em uma família, participa de uma cultura que também participam na produção de características individuais. Usamos mãos reais e simbólicas, assim como ouvidos reais e simbólicos ao fazermos e criarmos nossa clínica psicoterápica.



Anita Rink

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Arteterapia: Terapia em Atos de Criação


O ato de criação não é um gesto voluntarista, requer aceitação do involuntário no voluntário. (Gilles Deuleze)

O movimento de criar é um transformar para conhecer. A criação traça linhas de fuga, movimento que fogem do que é estabelecido possibilitando a continua Re-Singularização do indivíduo, como uma montagem das cartografias produtoras de novos sentidos. Criar também pode ser visto como Experimentar, reexperimentar, experimentar o novo e com isso procurar alterar processos hegemônicos de subjetivação ditadas socialmente e culturalmente. Experimentar é poder ouvir este estrangeiro que se faz presente no ato de criação. A terapia (Arteterapia e Clínica Transdisciplinar) possibilita que haja uma polifonia, muitas vozes, muitas comunicações e diferentes conteúdos sendo comunicados. O corpo fala, o objeto fala, o sentimento fala, tudo fala, portanto escutar é habitar as multiplicidades, entrar em contato com diferenças para que finalmente possamos transformar estas diferentes percepções e comunicações em verbo.

Experienciar o "si mesmo", não como substância, mas como abertura de possibilidades. Para isso devem-se soltar familiaridades e certezas... Construir outras identidades e outras formas de lidar com o mundo e com os outros, apropriando-se destas outras possibilidades.


Anita Rink

domingo, 14 de junho de 2009

Arte-Imago-Terapia


A Arteterapia utiliza a imagem como o fio condutor do processo terapêutico. Segundo a Psicologia Analítica elaborada por Carl Gustav Jung, cada sujeito é composto de múltiplas imagens: psíquicas, oníricas, do discurso, metafóricas, corporais, culturais, mitológicas, etc. Toda esta pluralidade psíquica tende a se organizar conforme estruturas míticas. Os sonhos, por exemplo, nos revelam enredos com imagens. Na Arteterapia a imagem ganha prioridade, pois ela possibilita o surgimento de novos enredos psíquicos e de imaginação. A clínica terapêutica utiliza-se diversos materiais que favorecem uma ordenação materializada das imagens. A caixa de areia, os lápis coloridos e o teatro, dentre outras técnicas de expressão, possibilitam uma abertura para a multiplicidade psíquica. Esta multiplicidade é composta de inúmeras imagens que se encontram no inconsciente e na consciência, no individuo e na coletividade. A criação de histórias pode trazer à consciência uma série de novos fatores emocionais, que colaboram com o sujeito em terapia e suas relações no mundo. A imagem se torna uma instancia de abertura para a renovação psíquica e o fio condutor do processo terapêutico. Podemos chamar este tipo de abordagem de “Clínica Ético-Estético-Política”, a ética seria uma abertura para o que é diferente do ego, uma nova forma de se relacionar com imagens. A estética se refere a uma clínica em que a criação, a criatividade e a imaginação estão presentes. E a política está ligada a uma ação singular que valoriza a pluralidade e por isso se torna uma resistência positiva em relação aos modos reducionistas e lineares que socialmente tem se estabelecido. Uma “Clínica Ético-Estético-Política” nos remete ao ato de se relacionar com imagens de um modo mais livre, criativo e inseparável da experiência terapêutica.


Anita Rink